Ser original é um desafio. De entrevistas de emprego a propagandas, o imperativo é: seja original. Mas, é possível ser original em uma realidade tão conectada tecnologicamente, onde cada frase, foto, ideia e insight é replicado numa progressão absurda nas diversas redes sociais. É possível falar em originalidade ou apenas em releituras? E qual o impacto da tecnologia nesse processo?
É indiscutível o aumento e presença da tecnologia no cotidiano. A vida está irremediavelmente vinculada a ela e os ganhos de eficiência são inquestionáveis. Geladeiras, carros, TVs e celulares ganham autonomia não apenas para participar do cotidiano, mas também para, em alguns momentos, decidir ou agir como uma pessoa. São aparelhos que possuem uma inteligência artificial. Por definição, inteligência artificial é quando máquinas se tornam aptas a tomar decisões e resolver problemas de maneira autônoma, por meio da análise de informações e padrões de comportamento, obtidas em um banco de dados prévio ou captados progressivamente em determinado ambiente.
Grandes corporações de todos os segmentos investem cada vez mais em tecnologia, dispensando a intervenção humana, principalmente em ações repetitivas. No campo jurídico, a tecnologia se faz presente, desde a digitalização de processos, pesquisa de temas em julgados, identificação de julgados semelhantes, separação de peças de processo e outros. Todos apresentam um algo grau de rendimento e significam uma atualização do sistema jurídico.
Ocorre que alguns aspectos dessa revolução tecnológica têm repercussões no campo jurídico. A título de ilustração, vejamos dois casos emblemáticos. Em 2016, a Sony CSL Paris desenvolveu um software que após diversas combinações e interações de estilos musicais, compôs a música Daddy’s Carque posteriormente teve a letra acrescentada pelo compositor Benoit Carré. O estilo e ritmo lembra uma das muitas músicas dos Beatles.
Também em 2016, uma parceria entre o Banco ING e a Microsoft possibilitou que um computador, depois de analisar 346 obras e 168.263 fragmentos de pinturas de Rembrandt, criasse uma obra inédita segundo as mesmas proporções e ângulos do genial artista holandês.
Nestes dois casos, deve-se perguntar a quem pertence os direitos autorais por essas criações. Se as empresas detentoras dos softwares que criaram estas obras, os cientistas envolvidos ou a própria máquina? Se fosse em solo pátrio, a legislação brasileira, afirma que direitos autorais pertencem a uma pessoa física. Ademais, é possível atribuir que a obra produzida por um robô, ainda que original, é um Rembrandt ou seria apenas algo inspirado no estilo do pintor? No caso da música, a melodia que lembra os Beatles poderia ser considerada um plágio da obra dos meninos de Liverpool?
Nos carros, cada vez mais autônomos, onde a função de motorista parece entrar em um lento processo de extinção, é possível questionar a quem se deve acionar em casos de danos materiais ou físicos. Esta já é realidade em alguns países.
Esses casos, ainda que distantes do cotidiano brasileiro, devem servir de indícios à legislação brasileira em seu processo de atualização. Não se pode apenas ignorar a chegada dessa revolução tecnológica e seus efeitos sociais e jurídicos.
Por hora não se imagina uma conspiração de máquinas, estilo skynet, mas há uma revolução silenciosa de máquinas que, apenas não ensaiam sorrisos no espelho, mas são capazes de significar a expressão facial refletida. É certamente um novo mundo esse. Mas, como já convidava Lenon, apenas “imagine,…um mundo assim”.